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__A hora da gramática___III (o género dos nomes...)

 

O ensino da gramática - do pré-escolar ao 3.º ciclo do ensino básico e ao ensino secundário


Tradução livre de alguns excertos de Rapport de Mission sur l'Enseignement de la Grammaire - de La Maternelle Au Collège

Autores: Alain BENTOLILA, Linguiste Professeur des universités, Paris 5 – Sorbonne
En collaboration avec :
Dominique DESMARCHELIER - Directeur du département de linguistique, Université Paris 5
Erick ORSENNA - Conseiller d’Etat, membre de l’Académie française

29 novembre 2006

II - De que nos servem as classificações se não formos capazes de colocar os nossos alunos em situações de uso e exploração dos contextos de ocorrência que as podem justificar?

De que nos servem as classificações gramaticais se não formos capazes de levar os nossos alunos a construir conhecimento, a estruturar melhor o pensamento próprio e a melhorar o seu desempenho no modo oral e no modo escrito?

Na sequência do elevado número de intervenções no Forum sobre a classificação de cujo(s), cuja(s), construímos o Mini-teste Utilização de "cujo(s), cuja(s)", na plataforma Moodle. O teste pode ser realizado com alunos do ensino secundário.

 

Para que serve a gramática?

O poder criativo da gramática distribui papéis aos seres e aos objectos que evocamos, mesmo se – e sobretudo se – o mundo nunca os tenha apresentado como tal; a gramática ornamenta os seres e objectos com certas qualidades, mesmo se – e sobretudo se – aos nossos olhos eles nunca se tenham apresentado assim. Se todas as línguas possuem esta capacidade de ir além do olhar, é porque exercem sobre as palavras um poder gramatical que não se limita a pôr em cena, fielmente, o espectáculo do mundo. Este poder gramatical é libertador: permite ao homem impor a sua inteligência ao mundo.

A Gramática e o poder da inteligência

(…) Ao colocar a palavra "terra" antes da palavra "gira", Copérnico impunha aos seus interlocutores a obrigação de fazerem da “terra” o agente do processo "girar". O agente e não outra coisa, qualquer que fosse o desejo que tivessem!

Utilizando a locução preposicional "em redor", Copérnico dava a "sol" um papel bem específico na cena que se devia reconstruir.

Os indicadores gramaticais deram-lhe assim a garantia de que, qualquer que fosse a má vontade dos seus interlocutores, nunca poderiam trair a intenção das suas palavras. (…)

 

Gramática, ciência e poesia

(…) Se num impulso de imaginação e de rigor misturados, a gramática transporta e difunde o pensamento científico, é nesse mesmo impulso que abre à poesia as portas do imaginário. (…)

 
Esta relação da poesia com a gramática alimenta-se da própria liberdade de cumprir e transgrerir as regras gramaticais. O texto "Anos felizes", de Mário Cesariny, pode servir de exemplo.

A Gramática, do segmentado ao global

(…) Combinar as palavras, para que esta reunião ordenada, esta solidariedade organizada transcenda a sequencialidade das palavras permitindo a cada leitor, a cada ouvinte, construir uma representação global coerente. Talvez seja esta a missão essencial da gramática.

De acordo com a vontade do locutor ou do escritor, a gramática reúne numa imagem global aquilo que o léxico, por seu lado, se esforçou por separar: reunir um objecto à sua cor ou à sua forma; reunir um agente à sua acção e, eventualmente, aquilo sobre que incide; reunir um acontecimento e o lugar onde se desenrola; e assim impor ao outro a sua entrada em cena, orientar o sentido que lhe vai dar. (…)

III - Para compreenderem melhor o funcionamento da língua, os alunos têm vantagem em desenvolver actividades metalinguísticas. As regras da gramática podem então ser transgredidas, sendo essas transgressões gramaticais possibilitadas através do jogo, jogo de palavras, jogo de combinação de palavras e jogo de combinação de frases que terminam em texto. As actividades de carácter metalinguístico permitem que os alunos descubram que as regras da gramática, para poderem ser transgredidas num jogo, devem ser antes conhecidas e cumpridas no uso corrente que fazemos da linguagem.

O estudo do género dos nomes (animados e não animados) possibilita uma exploração didáctica nesta perspectiva, com alunos dos 1.º, 2.º e 3.º ciclos.

A actividade Casamentos de Palavras foi construída como actividade metalinguística, com base no texto “Casamento”, de Luísa Ducla Soares, e encontra-se inserida no CD-ROM Cidade do Faz-de-Caso, onde pode ser realizada de forma interactiva.

O Casamentos de Palavras encontra-se igualmente publicado nos Materiais didácticos do GramáTICª.pt, em formato não interactivo, acompanhado de informação sobre os seus objectivos e pressupostos linguísticos e gramaticais.

A Cidade do Faz-de-Caso é um recurso multimédia da DGIDC, disponível em CD, que também pode ser guardado a partir de
http://www.dgidc.min-edu.pt/recursos_multimedia/recursos_cd.asp).

 

Que progressão?

O ensino da gramática conheceu os mesmos desvios do ensino da leitura: a renúncia ao respeito por uma progressão rigorosa na esperança ilusória de fazer do encontro com os textos o ponto de partida para a observação e a análise dos mecanismos da língua. (…)

Num caso como no outro, sacrificou-se desmesuradamente a progressão rigorosa, única garantia de uma aprendizagem eficaz, abandonando a articulação lógica da aprendizagem em proveito do encontro aleatório com diversos textos.

É preciso dizê-lo claramente, necessitamos de restabelecer uma programação precisa e rigorosa na aprendizagem da gramática. (…)

Preconizar uma programação das aulas de gramática que vá do mais simples ao mais complexo é sem dúvida também a melhor maneira de evitar uma das chagas do nosso ensino: a repetição sempre igual das mesmas análises e dos mesmos exercícios, aula após aula, nível de ensino após nível de ensino. (…)

Atenção! Não é porque preconizamos respeitar uma programação lógica das aulas de gramática que pomos de parte a escolha pedagógica da observação, da manipulação e da reflexão. Longe de nós a ideia de que uma lição de gramática se reduziria a apresentar uma regra e a ilustrá-la com um exemplo. Queremos que os nossos alunos descubram a organização das frases, a função das palavras, a sua categorização...; dizem bem "descubram" e não simplesmente "aprendam". Queremos, obviamente, uma aprendizagem que siga uma progressão lógica, do mais simples ao mais complexo e do mais frequente ao mais raro. Mas no âmbito desta progressão, cuidadosamente definida, cada lição de gramática articular-se-á sobre a observação de frases precisamente escolhidas para permitir descobrir, pela manipulação e pela reflexão, o facto gramatical que se decidiu estudar. Uma lição de gramática deve ser conduzida no espírito de uma "lição das coisas"; ou seja, que se deverá apresentar à atenção dos alunos um corpus de frases propositadamente escolhidas para induzir hipóteses sobre o funcionamento de um mecanismo singular. Na mesma lógica do "pôr a mão na massa" para as ciências, manipular-se-á, questionar-se-á, propor-se-ão explicações provisórias que, passadas pelo filtro das intenções precisas do professor, constituirão uma primeira etapa de análise. Esta abordagem, no decurso da qual cada aluno traz o seu contributo à reflexão, pode ser frutuosa apenas se o corpus de frases proposto for fabricado intencionalmente para orientar a observação, sugerir a manipulação, conduzir a uma conclusão, de antemão programada. É incompatível com o encontro ocasional com um texto.
(…)

 

 

 

 

I - A hora da gramática não tem, necessariamente, de passar apenas pelo encontro com "corpus de frases".

Os alunos podem explorar textos construídos propositadamente para o estudo do funcionamento de um aspecto particular da língua. O conjunto de actividades apresentadas no material Em família 1- 2- 3 assenta nesse pressuposto. O texto O aposto ou... Fim da temporada teve um objectivo muito semelhante.

http://media.education.gouv.fr/file/68/3/3683.pdf  
GramáTICa.pt, Janeiro de 2007