De acordo com o Dicionário Terminológico (DT), a frase passiva é uma «construção em que participam alguns verbos transitivos directos, transitivos directos e indirectos ou transitivos predicativos, na qual o constituinte interpretado como complemento de uma relação de predicação é realizado como sujeito, sendo o verbo conjugado numa forma composta, com o auxiliar "ser"».
A Gramática da Língua Portuguesa (2003), de Maria Helena Mira Mateus et alii, distingue três tipos de construções passivas: as passivas sintácticas (1), as passivas de –se (2) e as passivas adjectivais (3).
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Consideremos as propriedades das passivas sintácticas:
- o constituinte com a função de sujeito na frase passiva tem, na activa correspondente, a função de complemento directo;
- o constituinte introduzido pela preposição por na passiva – a que chamamos complemento agente da passiva de acordo com DT – tem a função de sujeito na frase activa. Este constituinte é opcional na frase passiva, ao contrário do que acontece na frase activa;
- existe constância de papel temático entre sujeito da passiva e complemento directo da activa correspondente, assim como entre complemento agente da passiva e sujeito da activa;
- ocorre na passiva uma forma auxiliar do verbo ser, ausente da activa correspondente, seguida de uma forma participial, que concorda em género e número com o sujeito.
Estatuto do complemento agente da passiva
A opcionalidade do grupo preposicional iniciado por por (que denominaremos constituinte por) poderia favorecer a ideia de que tal constituinte tem a função de modificador. No entanto, são vários os argumentos que permitem verificar o seu estatuto argumental:
1) Existindo constância de papéis temáticos na forma activa e na forma passiva, o constituinte por é interpretado como tendo um papel temático idêntico ao de argumento externo da frase activa correspondente, o que o distingue de constituintes introduzidos por por com nomes e adjectivos deverbais. Neste último contexto, só podem ser introduzidos pela preposição por constituintes com papel temático externo de Agente (4)-(5) ou papel temático interno directo (6):
(4)
(a)[O professor] AGENTE classificou os testes.
(b) a classificação dos testes pelo professor.
(c) os testes classificáveis pelo professor.
(5)
(a)[Os miúdos] EXPERIENCIADOR temem o escuro.
(b) * o temor do escuro pelos miúdos.
(c) * os monstros temíveis pelos miúdos.
(6)
(a)[Os miúdos] EXPERIENCIADOR admiram [os heróis] TEMA.
(b) a admiração dos miúdos pelos heróis.
2) Mesmo nas passivas em que o constituinte por não ocorre, está implícito o papel temático externo, daí ser possível, quando nelas ocorre um verbo agentivo, a presença de advérbios orientados para o agente ou de modificadores controlados pelo argumento externo implícito (7):
(7)
(a) Os dois reféns foram mortos intencionalmente.
(b) O banco foi assaltado para roubar dólares.
3) O constituinte por comporta-se como complemento e não como modificador quando é extraído de ilhas fracas (i.e frases que admitem a extracção de complementos mas não a de modificadores)
(8)
(a) [O que] lamentas [que tenha sido escrito [-]]?
(b) [Quem] lamentas [que [-] tenha escrito esse livro]?
(c) [Por quem] lamentas [que tenha escrito esse livro[-]]?
(d) *[Para que] lamentas [que o romancista tenha escrito esse livro[-]]?
(e) *[Como] lamentas [que o romancista tenha escrito esse livro[-]]?
4) O constituinte por comporta-se como complemento e não como modificador em relação ao processo da anáfora fazer/acontecer o mesmo:
(9)
(a) O João devolveu os livros [no domingo] modificador e a Maria fez o mesmo [no sábado] modificador
(b) Os livros foram devolvidos [no domingo] modificador e o mesmo aconteceu às revistas [no sábado] modificador (o mesmo aconteceu = foram devolvidas)
(c) *O João levou os livros [para a biblioteca] complemento e a Maria fez o mesmo [para a livraria] complemento
(d) *Os livros foram comprados [pelo João] complemento e aconteceu o mesmo às revistas [pela Maria] complemento
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