|
B3. Classes de Palavras - B4. Sintaxe - B6. Semântica |
Ana Costa e João Costa (2001). O que é um advérbio? Cadernos de Língua Portuguesa, 1.
Lisboa: APP, Colibri (pp. 81-82).
(texto adaptado)
6. Conclusões Da descrição e discussão apresentadas, torna-se óbvio que os advérbios não são uma classe homogénea. Assim, para a identificação e compreensão do funcionamento desta classe de palavras, concorrem vários critérios de natureza diferente, que devem ser utilizados de forma complementar. Em jeito de conclusão, listamos aqui as conclusões parciais a que chegámos relativamente às propriedades morfológicas, sintácticas e semânticas dos advérbios, bem como as conclusões relativas às funções sintácticas que um advérbio pode desempenhar: A - Propriedades morfológicas: Os advérbios não formam uma classe morfologicamente homogénea. (1) Qualquer palavra formada com o sufixo –mente a partir de uma base adjectival feminina é um advérbio. (2) Se uma forma varia em grau, não podendo o superlativo relativo ocorrer isolado, essa forma é um advérbio. (3) Os advérbios não formam uma classe semântica homogénea, existindo diferentes tipos de classes semânticas de adverbiais. (4) Os advérbios podem ser polissémicos, pertencendo a mais do que uma classe semântica consoante o seu significado. (5) Os advérbios pertencentes a uma mesma classe semântica podem exibir comportamentos sintácticos diferentes. Os advérbios que têm comportamento de operador podem associar-se obrigatoriamente com os constituintes focalizados da frase em que se encontram. (6) A mobilidade e a opcionalidade não são critérios seguros para a identificação de uma palavra como advérbio. Os advérbios não formam uma classe homogénea em termos de comportamento sintáctico. Salvaguardados os casos irregulares, os advérbios ocorrem em adjacência ao constituinte que modificam. O facto de existirem restrições de ordem entre advérbios numa mesma frase reforça a ideia de que a mobilidade não é um critério válido para a identificação de advérbios. D- Função sintáctica dos advérbios: Os advérbios podem modificar qualquer categoria não-nominal. Os advérbios podem ser complementos ou modificadores. (7) A classificação tradicional de complementos circunstanciais não dá conta de diferentes comportamentos que um advérbio pode assumir numa frase.
|
|
Uma análise morfológica das formas adverbiais contidas nos exemplos não revela nenhuma regularidade. Não é possível identificar marcas morfológicas comuns a todas estas formas. Apenas os advérbios em -mente (felizmente), apresentam regularidades morfológicas que permitem a sua identificação como advérbio.
|
|
(2) p.12 O processo de sufixação em -mente apresenta caracterísitcas diferentes da sufixação no geral. Quando se junta um sufixo dissilábico a uma palavra grave, o acento da base é suprimido, sofrendo as vogais o processo geral em português de elevação das vogais átonas. Por exemplo, ao juntar-se o sufixo -dade à base adjectival fácil, a vogal tónica passa a átona, e a qualidade da vogal é alterada, passando de [a] a [ɐ f [a]cil - f [ɐ Quando se forma um advérbio com o sufixo -mente, o acento original mantém-se como secundário, não sendo alterada a qualidade da vogal. Veja-se o que acontece com a vogal [a] de fácil, quando é formado o advérbio facilmente. Este comportamento do sufixo -mente faz com que ele seja considerado um afixo diferente dos outros afixos derivacionais. Esta autonomia manifesta-se não só no facto de este sufixo permitir que o acento principal da base se mantenha como acento secundário, mas também no que acontece quando são coordenados dois advérbios em -mente. Quando se dá coordenação de duas formas deste tipo, é possível colocar o sufixo -mente apenas no segundo advérbio: a. Ele leu o livro rápida e eficazmente. Esta frase mostra que o sufixo -mente pode ter escopo sobre os dois elementos coordenados, no que exibe um comportamento diferente de outros afixos derivacionais. Note-se ainda que o processo de formação de advérbios em -mente é produtivo. É possível a partir de uma qualquer base adjectival formar um advérbio deste tipo, como pode ser atestado pela existência de formas recentes como: b. ciberneticamente c.electronicamente d. plasticamente e.monitorizadamente f. computadorizademente. |
|
Construindo-se uma frase com a forma no grau superlativo relativo, observa-se que, com a forma adjectival, a expresão de todos é opcional, enquanto que o adjectivo possível é obrigatório com a forma adverbial, o que permite classificar depressa, não como adjectivo, mas como advérbio. |
|
(4)p.32 |
|
d. Certamente o Pedro leu o livro. |
Apesar de serem semelhantes aos advérbios de modo em -mente, nenhum dos advérbios - felizmente, infelizmente, supreendentemente - pode ser parafraseado como: Nestes casos, aquilo que o advérbio denota é uma acto avaliativo por parte do falante. Estas formas podem ser classificadas como advérbios orientados para o falante (advérbios disjuntos). Têm escopo sobre toda a frase, isto é, são modificadores de frase, nunca são internos ao grupo verbal. |
Um grupo nominal indefinido em posição de sujeito numa frase cujo verbo não esteja num tempo que exprima habitualidade ou cujo predicado não tenha valor genérico ( do tipo "Gatos são manhosos.") origina um resultado algo estranho. Quando os advérbios não (comportamento de operador) ou sempre (que se associa com foco) são inseridos na frase, a frase deixa de ser estranha. |
|
(a) O Pedro porta-se bem. (b') Foi ler o livro bem o que o Pedro fez. |
Tal como os sintagmas preposicionais, os advérbios também podem desempenhar função de complemento ou modificador. Contrastemos as frases (a) e (b):
(b') 'bem' não é obrigatoriamente deslocado com o verbo.
|