Projecto Falar

 

 

Avaliação em Língua Portuguesa

 

 

Maria de Lourdes Marques da Costa Pinhal

Lisboa

2000

 

 

 

Índice

 

Introdução *

I - As modalidades da avaliação *

1. A avaliação diagnóstica *

2. A avaliação Formativa *

3. A avaliação sumativa *

II - Diversificar os instrumentos de avaliação *

III - Que fazer com estes instrumentos? *

IV - A importância do "feedback" em avaliação

V - E a atribuição de classificações? *

VI - Conclusão *

VII - Bibliografia *

 

Introdução

1. Durante muito tempo, o termo avaliação aplicado ao ensino fez escola enquanto tradução numérica de desempenhos que ordenam os alunos do melhor para o mais fraco, servindo-se exclusivamente de um conjunto de técnicas de cotação e classificação.

Esses tempos vão longe, tão longe que todo o professor considera já clássica a distinção entre os termos avaliação sumativa, diagnóstica ou formativa. Mas este conhecimento teórico do que é a avaliação, corresponderá a uma prática efectiva e quotidiana no acto de ensinar? Não estará ainda imbuída de algum simplismo a avaliação que hoje se pratica na nossa escola, onde os "testes", que classificam, medem e comparam alunos, são o instrumento privilegiado de avaliação? Distingue-se verdadeiramente a avaliação sumativa da formativa, sem as opor, ou antes vê-se nesta distinção uma complementaridade, que permite passar de uma à outra, não confundindo os respectivos objectivos? Seleccionam-se metodologias, instrumentos, formas de interpretar resultados e de tomar decisões tendo em conta esta distinção? Promovem-se práticas de auto-avaliação que tornem interactiva a aprendizagem? Estas e outras questões espelham que a avaliação das aprendizagens dos alunos continua a colocar aos professores problemas de uma actualidade permanente.

Esta publicação, não pretendendo apresentar-se como um manual de avaliação ou uma recolha de técnicas e instrumentos de avaliação em Língua Portuguesa, quer-se, contudo, como um contributo para os professores que, aqui, poderão encontrar algumas considerações sobre a forma de avaliar conhecimentos e desempenhos dos alunos, assim como a forma de, quotidianamente, os acompanhar na construção do seu saber, acompanhamento que deverá, simultaneamente, informar o professor sobre o impacto do seu próprio ensino.

Dentro deste espírito, interrogar-nos-emos sobre o sentido da avaliação no processo ensino-aprendizagem e sobre a metodologia e os instrumentos de avaliação possíveis de aplicar, de acordo com a finalidade que se quer dar a essa avaliação.

2. O ensino-aprendizagem do português dos alunos do ensino secundário deve permitir-lhes consolidar conhecimentos práticos e reflectidos sobre a língua, dominar técnicas de expressão oral e escrita, apropriar-se de métodos de análise, de investigação, de reflexão, de composição, desenvolver e aprofundar a sua cultura, enfim, adquirir autonomia necessária para as mudanças que, no futuro, se imporão, quer no prosseguimento de estudos, quer na sua carreira profissional ou no dia a dia de homens e cidadãos.

Importa, por isso, tornar o aluno apto, no termo do ensino secundário, a expressar-se com correcção e clareza, oralmente e por escrito, de forma adequada à situação e às suas intenções, torná-lo apto a apreender o discurso dos outros e a apreciar os efeitos que produz no leitor ou auditor e compreender as razões desses efeitos.

O objectivo não é formar especialistas, mas leitores e auditores esclarecidos, cultos, que saibam expor o seu ponto de vista, respeitando e compreendendo o do outro. A tarefa do professor de português é, pois, particularmente pesada, exigindo-lhe uma selecção variada de actividades e situações que levem à descoberta de todos os tipos de linguagem, desde a da literatura, à da imagem, do cinema, da imprensa, da rádio, da televisão, da política ou da publicidade e ainda a forma de as explorar e avaliar.

Na planificação e execução deste trabalho de ensino-aprendizagem da Língua Portuguesa, como, aliás, de qualquer outra disciplina, a avaliação assume uma importância decisiva como factor indutor e regulador de todo o processo. Com efeito, a avaliação pode mostrar, por exemplo, que a planificação não está adequada à turma respectiva, pode mostrar que, no decurso das actividades de ensino-prendizagem de uma sequência de ensino, essas actividades não estão a permitir aos alunos atingirem os objectivos previstos. A avaliação intervém, pois, em todos os momentos do processo de ensino-aprendizagem, a avaliação é um processo contínuo que deve estar integrado na acção educativa como uma das suas vertentes fundamentais.

Convém, pois, que se comece por esclarecer as diversas funções e modos de avaliação, assim como as decisões que daí derivam, para assegurar coerência ao processo ensino-aprendizagem.

O recente documento da Revisão Curricular para o Ensino Secundário, do Departamento do Ensino Secundário (R.C.E.S.), onde se enunciam as grandes linhas da organização curricular para o ensino secundário a partir do ano lectivo de 2001/02, depois de referir os princípios orientadores da revisão curricular e enumerar os novos cursos gerais e tecnológicos do Ensino secundário, dá uma especial importância aos princípios e à organização da avaliação das aprendizagens dos alunos, realçando a necessidade de diversificar as estratégias de avaliação e os instrumentos de avaliação, dentro do quadro das alterações previamente apontadas.

Este documento refere as modalidades de avaliação a considerar na sala de aula e na escola, modalidades que correspondem, se não entrarmos em detalhes, às três grandes funções que os especialistas atribuem à avaliação: uma função de diagnóstico da situação inicial do aluno (avaliação diagnóstica), uma função de regulação do processo ensino-aprendizagem (avaliação formativa), uma função certificativa dos resultados obtidos no final de certos períodos mais ou menos longos do ensino-aprendizagem (avaliação sumativa). Os professores conhecem estas distinções que, aliás, já vêm fazendo parte do discurso de documentos oficiais desde há algum tempo, mas nem sempre têm conseguido pô-las em prática no seu ensino, por razões muitas vezes alheias à sua vontade, de uma forma generalizada e sistemática. Contudo, como se refere no documento da R.C.E.S. " a semestralidade das classificações quantitativas, a organização dos tempos lectivos em 90 minutos e o aumento do número anual de semanas lectivas" (p.33) favorecerão, num futuro muito próximo, a efectiva diversificação de modalidades, estratégias e instrumentos de avaliação a utilizar .

I - As modalidades da avaliação

      1. A avaliação diagnóstica

No início de cada momento importante do ensino/aprendizagem (ano lectivo, período escolar, unidade de ensino/aprendizagem), importa verificar primeiro os níveis de aprendizagem dos alunos, de modo a tomar esses níveis como referência para a planificação. Esta verificação designa-se de avaliação de diagnóstico.

No início do ano lectivo esta avaliação é fundamental para verificar as características sociolinguísticas e psicolinguísticas dos alunos, os seus conhecimentos e capacidades. É um trabalho que deverá ter sentido também para o aluno e permitir-lhe, por um lado, comprovar os seus próprios conhecimentos relativamente à matéria de ensino e, por outro lado, implicá-lo na participação da aprendizagem e na auto-avaliação do seu progresso ao longo da unidade, assim como levá-lo a verificar que uma nova aprendizagem depende sempre de conhecimentos anteriores.

No documento da R.C.E.S. refere-se, aliás, a possibilidade de haver nos programas do 10º. Ano," um módulo inicial no qual se incluem conceitos prévios considerados essenciais e estruturantes das disciplinas em causa" (p. 32) a serem trabalhados no início das aulas, servindo este módulo para diagnosticar dificuldades que eventualmente se venham a verificar. Na disciplina de Língua Portuguesa, este momento reveste-se de particular importância, importando obter uma informação variada acerca do aluno e tomar decisões adequadas face ao diagnóstico que se vai obtendo.

Procedimentos :

Decisões possíveis:

1. A avaliação Formativa

A avaliação formativa tem uma função de regulação permanente do processo de ensino-aprendizagem, isto é, visa essencialmente assegurar a todo o momento a adequação desse processo à realidade turma, aluno, professor, recursos. Pela avaliação formativa, o professor acompanha de perto o aluno, assegura-se das suas aprendizagens em cada momento, identifica os seus pontos fortes e fracos a fim de lhe fornecer as orientações que se impõem e de o motivar para o prosseguimento da sua aprendizagem. As decisões que decorrem da avaliação formativa são de ordem pedagógica e não são definitivas. Elas visam informar o aluno, os pais do aluno, o professor sobre o que é necessário corrigir ou melhorar e sobre as medidas a tomar para o conseguir.

Para a recolha de dados que permitam a regulação do processo, o professor pode recorrer a toda a gama de meios de avaliação ao seu alcance:

Procedimentos:

2. A avaliação sumativa

A avaliação sumativa consiste num balanço do que o aluno aprendeu e quer-se globalizante. Ela deve reflectir a síntese das aprendizagens realizadas no período a que diz respeito: conhecimentos, competências, capacidades e atitudes do aluno.

Tal como acontece na avaliação diagnóstica e formativa, a avaliação sumativa no ensino-aprendizagem da Língua Portuguesa deve necessariamente incidir nos seguintes domínios de conhecimento: ouvir, falar, ler, escrever. Decorre daqui, se outras razões não houvesse, que o professor deverá recorrer a procedimentos diversificados de avaliação, sendo o teste de papel e lápis um desses instrumentos, mas não o único, nem o privilegiado.

Indicam-se, a seguir, alguns exemplos de procedimentos de avaliação, cada um deles susceptível de variantes diversas.

Procedimentos:

Decisões possíveis:

Os dados recolhidos pela avaliação sumativa podem, igualmente, ser mobilizados para a tomada de decisão sobre o que fazer a seguir, também servindo para:

 

AS FUNÇÕES DA AVALIAÇÃO

  • Uma função de diagnóstico

Trata-se de verificar se os alunos possuem os requisitos mínimos para iniciar e acompanhar uma sequência de novas aprendizagens. Se não, importa prever actividades específicas para combater as lacunas. É uma avaliação inicial de ano lectivo, de período escolar ou de unidade de ensino-aprendizagem.

  • Uma função formativa

A sua finalidade é facilitar as aprendizagens. Nestas avaliações, que devem ser frequentes, o aluno tem direito a enganar-se. Os erros e as dificuldades são explorados pelo professor para voltar a explicar. É um momento privilegiado de diálogo que deve permitir:

    • Ao aluno: saber se progrediu ou fracassou e as presumíveis causas dessa situação;
    • Ao professor: propor actividades de ajuda aos alunos em dificuldade e actividades mais complexas para os alunos com um bom desempenho. Os dados recolhidos permitirão ainda ao professor reajustar objectivos, actividades e recursos de ensino-aprendizagem.

  • Uma função sumativa

É a avaliação que se realiza no termo de uma aprendizagem e que fornece dados sobre o nível da aprendizagem dos alunos. Esta avaliação ocorre mais frequentemente após actividades conducentes à aquisição de uma técnica, após actividades de intervenção personalizada, após o desenvolvimento de uma unidade didáctica ou após um período lectivo. É geralmente representada por uma nota que pretende indicar o nível global de cada aluno.

II - Diversificar os instrumentos de avaliação

Uma avaliação contínua e sistemática deverá socorrer-se, como já foi referido, de instrumentos de avaliação diversificados, cabendo a cada professor, em função das características de cada instrumento, daquilo que pretende avaliar e do contexto em que se vai aplicar, fazer as opções mais adequadas. Há grandes benefícios para o aluno nesta diversificação, pois sabe-se que o seu desempenho se poderá afastar das suas competências, quando confrontado com determinado tipo de provas. A diversificação reduz igualmente a subjectividade na avaliação e permite uma maior justiça no acto de avaliar. Com efeito, cada instrumento fornece um determinado tipo de dados; a utilização exclusiva de uma técnica significa renunciar a informações que poderiam ser obtidas por outra(s) técnica(s).

Com que instrumentos se pode avaliar?

1.

Instrumentos de Observação

  • Listas de verificação ou check-lists
  • Escalas de classificação
  • Grelhas de observação

 

2.

Testes Objectivos

  • Itens de escolha múltipla
  • Itens de associação
  • Itens do tipo verdadeiro/falso
  • Itens de completamento

 

3.

Testes não Objectivos

  • Itens de composição curta
  • Itens de ensaio

 

Instrumentos de Observação

Listas de verificação (Check-list): São listas de enunciados que indicam as diferentes componentes de uma conduta ou dimensão da aprendizagem. Regista-se se o sujeito ou a situação evidenciam ou não cada uma dessas componentes que figuram na lista. São listas de verificação de sim ou não.

Apresenta-se, a seguir, uma lista de verificação sobre uma exposição oral.

Exposição Oral

1.Sabe informar /Convencer /Desenvolver uma problemática

 
SIM
NÃO
Transmite conhecimentos precisos, adaptados ao assunto.    
Apresenta argumentos pertinentes    
Aprofunda as questões suscitadas pelo tema / assunto    
Apresenta referências bem escolhidas    

2. Esclarece o tema da exposição

 
SIM
NÃO

Preparou um plano claro e pertinente

   

Apresenta-o:

- distribuindo-o previamente aos colegas

   
- projectando-o por acetado
   
- escrevendo-o sucintamente no quadro
   
- anunciando-o oralmente
   

- recordando-o no decurso da exposição

   
- Cita as fontes a que recorreu
   

 

3. Faz-se compreender

 
SIM
NÃO

Tenta não ler as notas

   
Fala em tom de voz audível    
Articula correctamente as palavras    
Evita bordões e interjeições parasitas    

Fala pausadamente

   

Exprime-se em linguagem correcta, adaptada à situação de oralidade

   
Utiliza esquemas ou documentos ou acetatos ou outros elementos para melhor se fazer compreender    

 

4. Adapta-se ao auditório

 
SIM
NÃO

Dá tempo para que se tomem notas

   
Sabe acelerar, se necessário    
Responde às perguntas, sem se deixar ultrapassar pelos acontecimentos    
Assegura-se de que o auditório segue e compreende    

 

5. Gere o tempo

 
SIM
NÃO
Cronometra a sua intervenção    
Equilibra a extensão das diferentes partes    

 

Fonte: Acção de Formação promovida pela APP, Dezº. 93

 

 Escalas de classificação: escalas como as de verificação, só que nestas valoriza-se o grau em que o sujeito ou a situação possuem diferentes componentes. A valoração pode ser numérica (por exemplo de 1 a 5), estimativa (muito, pouco, nada; sempre, às vezes, nunca) ou descritiva (faz-se uma descrição da característica observada ou selecciona-se a descrição que melhor reflicta a situação):

Objectivo: Comunicar bem oralmente

1

2

3

4

5

Estrutura a resposta

É claro na exposição

Revela originalidade

 

Fonte: I.I.E. Curso de Formação de Formadores 1993

Objectivo: avaliar o grau de participação do aluno na discussão da sala de aula

1. Como participou o aluno na discussão?

|_____________|_____________|_____________|________

nunca participa | participa tanto como os outros elementos do grupo | participa mais do que os outros

Comentário: _______________________________________________________

2. Como se relacionaram os comentários com os tópicos da discussão?

|_____________|_____________|_____________|_____________|

comentários incoerentes, afastados dos tópicos

comentários normalmente pertinentes, por vezes afastados dos tópicos

comentários sempre relacionados com o tema

Comentário: _______________________________________________________

Fonte: Gronlund, N. e Linn, L., in Lemos et all (1993)

 

 

Grelhas de Observação: As grelhas de observação permitem o tipo de registos referidos anteriormente e apresentam a vantagem de se poder observar a frequência de um comportamento e a progressão no mesmo.

Segue-se um exemplo de grelha de observação para avaliar a evolução do aluno na expressão escrita.

Aspectos a observar:

Tema:________

Data:________

Tema:________

Data:________

Tema:________

Data:________

Compreensão do assunto

     

Domínio do género

     

Coerência textual

     

Adequação de vocabulário

     

Correcção de:

Ortografia;
Pontuação;
Morfo-sintaxe

     

Originalidade quanto a:
Pontuação
Sintaxe;
Vocabulário

     

Capacidade crítica

     

 

Fonte: Serra, M-T e Ferraz, M-J. 1987 (adaptado)

 

Testes Objectivos

Itens de escolha múltipla: Este tipo de itens apresenta enunciados e várias propostas de resposta para cada um deles. O aluno deve identificar a resposta correcta dentro das opções propostas.

Exemplo:

O Renascimento é um movimento que se inicia no século XVI, em Itália. Qual a sua característica fundamental? (assinale com uma X a resposta correcta)

  1. Um sentido racional liberto de todos os valores do passado.
  2. Uma valorização do homem relativamente a Deus.
  3. Uma sobrevalorização do homem como centro da criação.
  4. O renascer de uma nova mentalidade teocêntrica

 

Itens de associação: São fornecidas ao aluno duas listas de itens e ele deverá associar cada elemento do conjunto da esquerda a um elemento da lista da direita.

Testes não Objectivos

Em Língua Portuguesa, os testes não objectivos ocupam uma posição de destaque de entre o leque dos vários instrumentos de avaliação existentes, explicando-se esta opção pela possibilidade que oferecem de testar competências inerentes à aprendizagem da língua (nomeadamente competências de compreensão e de expressão escritas) que não são possíveis de avaliar com outro tipo de testes.

Na construção dos testes não objectivos, o professor de português opta, geralmente, por itens de composição curta para avaliar aspectos da compreensão e interpretação de um texto, assim como a organização e a forma de elaboração das respostas a um questionário sobre esse texto. Fazem também parte destes testes os itens de composição extensa ou de ensaio, devendo o aluno escrever um texto, subordinado a tópicos apresentados.

A principal desvantagem apontada a este tipo de testes é a dificuldade da sua correcção. Para reduzir esta limitação, o professor deverá explicitar critérios de correcção claros e construir cenários de resposta que garantam a validade e a fidelidade da avaliação efectuada.

Para ilustrar este tipo de teste, apresenta-se, a seguir, excertos da prova escrita de Português B do 12º. Ano (modelo 2000), a qual contempla as considerações acima referidas.

Fernando Pessoa, Poemas de Álvaro de Campos, Lisboa, INCM, 1992.

 

Apresente, de forma bem estruturada, as suas respostas ao questionário sobre o texto lido.

1. No poema, o sujeito evoca uma viagem de barco. Caracterize o espaço físico representado.

Cenário de resposta: O espaço físico evocado é o convés dum navio, numa viagem marítima, em noite de luar.

A "cadeira de convés", em que o sujeito se representa recostado para trás, o "ruído do salão de fumo", onde "acabara a partida de xadrez" (vv. 4 e 5 ), a alusão à "sueca" (v.12) são elementos indiciadores do ambiente requintado e cosmopolita dos paquetes de luxo. O movimento cadenciado das ondas, balouçando a cadeira de convés (vv.6-7), e a presença do "luar" (v.25) completam o quadro com a sugestão de um mar tranquilo.

2.Explicite os efeitos de ritmo e de sentido produzidos pela repetição da interjeição "Ah" (vv. 6, 8, 13, 19, 22).

Cenário de resposta: A interjeição "Ah" ocorre, anaforicamente, nos versos 6, 8, 13, 19 e 22. Esta anáfora marca o ritmo do poema.

Por outro lado, pela associação aos adjectivos "balouçado", "embalado", "afundado", o repetir da interjeição "Ah" assinala um crescendo no estado de torpor em que o sujeito se encontra.

As duas ocorrências finais, em que esta anáfora se expande em unidades maiores ("Ah, todo eu anseio / Por esse momento", "Ah, todo eu anseio por esse momento"), tornam mais claro o sentimento expresso pela interjeição: o desejo de reencontro, por parte do sujeito, desse instante e de "outros análogos" do passado.

3. Interprete a comparação entre o "eu" e um "livro" (vv.11-12).

Cenário de resposta: A comparação entre o "eu" e "um livro" é interpretável de vários modos, nomeadamente:

    • A causalidade banal do livro ali deixado é aproximada à sensação de estar ali, esquecido de si, liberto de cuidados e obrigações;
    • Ao rever-se na imagem do livro deixado ali por acaso, o "eu" sublinha o seu desejo de quietude ou de anonimato – ele está ali na "cadeira de convés" como uma coisa em que ninguém repara;
    • ...

(nota: a apresentação de uma linha de interpretação plausível é considerada suficiente para a atribuição de totalidade da cotação referente aos aspectos de conteúdo).

4. Comente o sentido da alusão à infância (vv. 16-18).

Cenário de resposta: A alusão à infância é suscitada pela analogia entre o estado de espírito do sujeito lírico – recostado na "cadeira de convés" – e a criança que fora "outrora". "Quando brincava na quinta". Ignorante dos saberes e das convenções dos adultos, o "eu" da infância vivia o presente com a despreocupação da sua inocência. Essa pureza original é como que recuperada naquele instante privilegiado de semiadormecimento que permite ao sujeito abandonar-se à simples vivência do momento.

5. Explique por que razão o sujeito poético anseia "por esse momento, como por outros análogos" (v.22).

Cenário de resposta: No final do poema, o sujeito poético expressa, reiteradamente, o seu anseio por aqueles momentos da sua vida em que, tal como na "cadeira de convés", se entregou, sem preocupações, ao presente, vivido e apreciado enquanto tal.

O anseio do sujeito poético por estes momentos "sem importância nenhuma" – em que nada acontece e a própria consciência do "eu" está como que suspensa, semiadormecida – funda-se, nomeadamente, nas seguintes razões:

    • tais instantes possibilitam ao "eu" experienciar o próprio "vácuo da existência", sem o problematizar ou questionar dentro de si;
    • esses momentos significam repentinas aproximações do "eu" adulto à sua infância perdida, quando viver fora, simplesmente, fruir em pleno cada instante.
    • Em suma, nestes momentos realiza-se o anseio do sujeito poético pelo abrandamento da racionalidade, pela vivência do imediato apreendido pelos sentidos ("Na sensação das ondas", v.7; "sentir-me ali", v.11).

A análise de um texto literário, conduzida por um questionário, visa avaliar as competências de compreensão e de expressão escritas.

Ao classificar as respostas do examinando, o professor deverá observar o domínio das seguintes capacidades:

    • compreensão do sentido global do texto;
    • adequação da resposta aos objectivos da pergunta;
    • interpretação do texto através da identificação e da relacionação dos elementos textuais produtores de sentido, na base de informação explícita e de inferências;
    • interpretação do texto fundada no diálogo entre as referências textuais, no seu contexto, e o leitor;
    • produção de um discurso correcto nos planos lexical, morfológico, sintáctico e ortográfico.
    • Factores específicos de desvalorização:
    • O afastamento integral dos "aspectos de conteúdo" relativos a cada uma das perguntas do questionário implica a desvalorização total da resposta.
    • Nos casos em que o professor considerar que, para além de incompleta, a resposta se apresenta formulada num texto de extensão tão reduzida que não permite uma avaliação fiável da correcção linguística, deverá a cotação deste parâmetro ter uma desvalorização proporcional aos aspectos de conteúdo não contemplados na resposta do examinando.

 

Grupo II

A procura da justiça e a natureza são dois temas da obra poética de Sophia de Mello Breyner Andresen.

Fazendo apelo à sua experiência de leitura, apresente, de entre os temas referidos, aquele que para si se revelou mais marcante na poesia desta autora. Desenvolva a sua opinião num texto expositivo-argumentativo bem estruturado, de cem a duzentas palavras.

Observações:

1. Para efeitos de contagem, considera-se uma palavra qualquer sequência delimitada por espaços em branco, mesmo quando esta integre elementos ligados por hífen (ex.:/dir-se-ia/). Qualquer número conta como uma única palavra, independentemente dos algarismos que o constituem (ex.: /2000/).

2. Um desvio dos limites de extensão indicados implica uma desvalorização parcial do texto produzido.

A produção de um texto expositivo-argumentativo visa avaliar as competências de leitura crítica de textos literários e de expressão escrita.

Tratando-se de um item sem orientações precisas de resposta, ao classificar o texto do examinando, o professor deverá observar o domínio das seguintes capacidades:

    • formulação de juízos de leitura, a partir da experiência pessoal, manifestada na escolha de referências pertinentes;
    • estruturação de um texto com recurso a estratégias discursivas adequadas à defesa de um ponto de vista;
    • produção de um discurso correcto nos planos lexical, morfológico, sintáctico e ortográfico.

Factores específicos de desvalorização:

    • O afastamento integral do tema proposto implica a desvalorização total da resposta.
    • Se o texto produzido apresentar um número de palavras inferior ou superior aos limites de extensão indicados na prova, o professor deverá descontar quatro (4) pontos à classificação obtida pela resposta do examinando, depois de aplicados todos os outros critérios definidos para este grupo. Nos casos em que, da aplicação deste factor específico de desvalorização, resultar uma cotação inferior a zero (0) pontos, deverá ser atribuída a este grupo a classificação de zero (0) pontos.

Grupo III

(...)

-

III - Que fazer com estes instrumentos?

As várias modalidades de avaliação, já o referimos, distinguem-se basicamente pelos objectivos que perseguem, mais do que pelos instrumentos que utilizam. Assim, um mesmo tipo de instrumento pode ser útil em diferentes momentos de aprendizagem, ainda que as decisões que se tomem em função dos dados obtidos possam ser diferentes. Deste modo, qualquer instrumento de avaliação só faz sentido se estabelecer uma congruência entre ensino, aprendizagem e avaliação. Para isso, é necessário que os estudantes estejam conscientes daquilo que vão aprender, que construam um ideia do produto esperado, que se apropriem dos critérios e instrumentos de avaliação que o professor usará. A comunicação entre os actores da situação didáctica é o primeiro factor a privilegiar, podendo ainda o professor munir o aluno, em momentos oportunos ( no início do ano, antes do início de uma matéria ou unidade de ensino), de instrumentos relativos ao domínio em estudo e que lhe permitam ter uma representação das acções que deverão realizar para alcançar êxito nas tarefas propostas ou na aplicação de conceitos. Nesta perspectiva, as grelhas ou referenciais de análise constituem dispositivos que, orientando o processo ensino/aprendizagem, se constituem igualmente como referentes na avaliação a realizar, dotando ainda o aluno de instrumentos heurísticos que lhe permitem uma representação da tarefa a executar, seja essa tarefa do domínio do falar, do ouvir, do escrever ou do ler.

O professor poderá recorrer a grelhas únicas, uma para cada domínio, ou a grelhas específicas destinadas à recepção e produção de textos particulares. Contudo, há que ter sempre em conta as limitações que estes instrumentos podem apresentar, evitando que se tornem em modelos que reforcem estereótipos escolares que não diferenciam nem hierarquizam o processo de ensino/aprendizagem.

Como exemplo de grelha específica, veja-se a proposta de A. Boissinot, in Biard, J. E Denis, F. (1993) para um modelo de síntese de leitura de textos argumentativos. Neste caso, a interrogação sobre o texto está organizada em três campos de aplicação (a enunciação, o léxico, a organização) e desenvolve-se numa estratégia progressiva, que parte de observações e referências, para desembocar na organização do texto a que o autor chama "circuito argumentativo".

Grelha de leitura do texto argumentativo

Observação do texto

Enunciação

- Quais são os tópicos enunciativos em presença?

-Há modalizadores que valorizam ou desvalorizam um ponto de vista?

- Quais são as marcas de subjectividade a favor ou contra uma tese?

Léxico

-Quais os campos lexicais contraditórios a que o texto faz referência?

-É possível identificar no texto redes semânticas em oposição?

Organização

- Quais os elementos que informam sobre a organização do texto:

disposição gráfica?

progressão temática?

Conectores argumentativos?

A dinâmica do texto

-Como é que os diferentes indícios estão distribuídos no texto?

- Há evoluções susceptíveis de fornecer informação sobre a progressão do texto?

O circuito argumentativo

- Quais são as teses em presença? Estão explicitamente formuladas? Onde?

- Quais são os diferentes argumentos? A que tese se referem?

- Como é que estão organizados?

Fonte: A. Boissinot, in Biard, J. E Denis, F. (1993), (p. 28)

Retomando o que afirmávamos no início desta secção, quer se trate de avaliação formativa ou sumativa, a recolha de dados para os diversos aspectos inerentes aos domínios do ensino do português apoiar-se-á igualmente em diversos instrumentos e procedimentos.

Os procedimentos podem ir desde os mais informais, como a observação, o questionário, a análise de respostas dos alunos, até aos mais formais requerendo a utilização de instrumentos de medida como os que foram apresentados anteriormente: escalas de atitudes, grelhas de avaliação descritivas, grelhas de auto-avaliação, testes formais.

Em Língua Materna, os procedimentos informais são uma prática corrente,

pois o professor que está em permanente interacção com os seus alunos está também atento às suas respostas, às suas intervenções, corrigindo os erros que poderão constituir entrave à comunicação e verificando ao longo do tempo o impacto dessas correcções. No quadro dos procedimentos mais formais, se o professor pretende apenas fazer controles pontuais, poderá recorrer a questionários orais e escritos; se pretender fazer observações no decurso de uma aprendizagem, durante a execução de uma tarefa, então será útil socorrer-se de listas de verificação; se pretende verificar qualidades de um desempenho oral, utilizará uma grelha de avaliação da qual constem os critérios de desempenho oral, tais como a competência linguística (léxico, morfossintaxe, fonética), a competência discursiva (coerência e coesão da mensagem) ou a competência sociolinguística (adaptação do discurso à situação de comunicação).

Também no caso da avaliação das várias produções escritas ( um texto criativo, um resumo, um texto expositivo-argumentativo ), a utilização de uma grelha de avaliação, identificadora dos parâmetros a avaliar e que comporte os critérios de desempenho requeridos para cada parâmetro, torna-se essencial para registo dos vários elementos visados na aprendizagem, o mesmo acontecendo para a compreensão da leitura, de um texto narrativo, lírico ou dramático.

A seguir se apresentam dois exemplos de grelhas, uma para a avaliação de um texto expositivo-argumentativo e outra para avaliação de um resumo, nas quais se explicitam os parâmetros a avaliar e uma proposta de operacionalização desses parâmetros. Haverá, depois, que estabelecer os critérios de avaliação de cada parâmetro, fixando as características que cada desempenho deve ter para ser considerado num certo nível da escala de apreciação.

Avaliação para um texto expositivo-argumentativo

Parâmetros

Operacionalização

1.Compreensão da tese enunciada

a) reconhece o sentido geral do tema;

b) não se afasta da problemática proposta;

c) se há mais do que um factor a abordar, aborda-os todos.

2. Formulação de juízos

a) formula vários argumentos;

b) os argumentos são lógicos, persuasivos;

c) utiliza contra-argumentos.

3. Ilustração dos argumentos com exemplos

a) há pelo menos um exemplo para cada argumento;

b) o exemplo é ilustrativo da experiência pessoal, da actualidade, de conhecimentos literários convocados.

4. Estruturação do texto

a) a introdução coloca o problema ou questão e anuncia o desenvolvimento;

b) há uma ordem lógica, coerente com a conclusão a que se quer chegar;

c) há frases de transição que asseguram o encadeamento;

d) a conclusão retoma as grandes linhas do desenvolvimento; responde à questão colocada; alarga, eventualmente, o debate.

Parâmetros

Operacionalização

5. Redacção com correcção linguística

a)utilização correcta

. da ortografia;

. das palavras de ligação;

. da pontuação;

. das orações subordinadas.

b)expressão clara:

. vocabulário preciso e diversificado;

. construções sintácticas variadas; .

articulação lógica dos parágrafos.

 

Avaliação para um resumo

Parâmetros

Operacionalização

1. Compreensão da estrutura global do texto

a) reconhece o assunto geral do texto;

b) selecciona as palavras – chave;

c) divide o texto em partes e atribui um título a cada uma;

d) identifica as relações lógicas entre cada parte do texto.

2. Supressão de elementos acessórios

a) cinge-se ao essencial, eliminando o acessório;

b) suprime os exemplos isolados, as repetições, as citações, as interjeições, o diálogo

3. Conservação do sentido global do texto

Respeita:

a) o sentido geral do texto;

. as palavras-chave;

. as articulações lógicas;

. a ordem do texto;

. as ideias fundamentais

b) reformula as ideias essenciais de forma "económica" (1/4 se não houver indicação explícita);

c) não introduz opiniões pessoais.

4. Redacção com correcção linguística

a) utilização correcta

. da ortografia;

. da pontuação;

. das palavras de ligação.

b) discurso conciso, claro e coerente.

 

IV - A importância do "feedback" em avaliação

Fornecer ao aluno um feedback oportuno sobre o trabalho que ele realizou e que o professor corrigiu é um tema recorrente em estudos sobre avaliação e um indicador de eficácia em estudos sobre a qualidade das escolas.

Na oralidade, esta tarefa apresenta-se facilitada, dado que esse feedback é imediato, permite criar um sentimento de partilha, permite observar o "eco" produzido e criar um sentimento de se ter avançado, de se terem criado condições para o aluno ir mais longe, sobretudo quando professor e aluno discutiram em tempo oportuno os objectivos desse trabalho oral e se o aluno dispõe de instrumentos de referência, onde estão explicitados os critérios que guiarão o seu trabalho.

Quanto às produções escritas, o tempo despendido pelo professor na correcção destes trabalhos só ganhará sentido se essa correcção tiver impacto para a aprendizagem do aluno, se lhe oferecer pistas úteis para uma auto-correcção e tomada de consciência dos seus êxitos e lacunas. Sabe-se que o recurso a uma nota numérica, global, tem pouco interesse para orientar a regulação das aprendizagens. Na verdade, o saber que obteve num teste, num trabalho, uma classificação de 7, 10,14, 15 sobre 20 não fornece ao jovem qualquer indicação sobre as suas dificuldades, nem sobre a forma de as melhorar.

Assim, a posição que a seguir se defenderá é a que considera as anotações como um recurso que, individualizando o feedback, permitirá ao aluno, no futuro, não cometer o mesmo erro e retomar e valorizar o que já sabe fazer bem.

Como proceder? Como organizar as observações? Como seleccionar o que deve ser objecto de anotação para não afogar o essencial no acessório?

Tomando como referência a obra de Odile e Jean Veslin (1992)., vejamos algumas sugestões:

Características de um feedback útil à aprendizagem

 

Uma anotação deve:

Ser legível – Parecendo, embora, uma evidência, há que criar condições para o registo de notas, devendo a prova do aluno ter uma margem, tanto do lado direito como do esquerdo, que comporte as rectificações e observações do professor. O recurso a um código de correcção, ou a um código de abreviaturas, previamente proposto, discutido e aceite pelos alunos tem toda a utilidade, sobretudo para questões relacionadas com a ortografia (ort.), vocabulário (voc.), pontuação (pont.), etc.

Valorizar os aspectos positivos – O reforço positivo encoraja o aluno a agir de forma cooperativa e autónoma, evidencia expectativas positivas em relação ao seu desempenho, favorece o progresso da sua aprendizagem, permitindo-lhe apoiar-se, no futuro, no que já sabe fazer bem. Frases do tipo " fizeste uma boa escolha para o título do teu texto"; "o teu trabalho segue um plano coerente (introdução, desenvolvimento, conclusão)"; "as transições entre cada parte são lógicas"; "documentaste-te bem sobre o assunto" aumentam a motivação do aluno e o seu interesse pelo trabalho. Pelo contrário, vocábulos e expressões como "vago"; "pouco claro"; "confuso"; "incorrecto", para além de não conduzirem ao reconhecimento do erro, poderão, em vez de estimular o aperfeiçoamento, provocar no aluno um efeito dissuasor.

Seleccionar os erros de forma realista – Assinalar todos os erros observados na produção escrita do aluno não significa que todos eles devam ser objecto de observações, correndo-se o risco de afogar o que "para aquele texto", com "aqueles objectivos" e "critérios" é mais pertinente, importando sobretudo fazer uma triagem, para que o excesso de informação não disperse o aluno e não o desvie do que é prioritário.

Apelar à auto-correcção – O professor não se poderá dispensar de fazer críticas, objecções ou complementar o trabalho do aluno, contudo deverá promover a auto-correcção. Como? Incitando o aluno a identificar os erros, a inventariá-los, remetendo-o para matéria dada em aula, fichas de estudo em posse do aluno, gramáticas, etc. Mas esta remissão para aquisições anteriores só ganha sentido se houver um "depois", isto é, a correcção que o aluno terá que fazer na reescrita daquele texto e no aperfeiçoamento de textos posteriores.

Em síntese:

Um feedback útil à aprendizagem

    • ajuda a aprender;
    • dirige-se a um destinatário;
    • assinala realizações conseguidas e erros concretos;
    • dá abertura para actividades posteriores;
    • trata o erro como factor inerente à aprendizagem;
    • intervém de forma a que o aluno possa auto-corrigir-se;
    • escolhe, selecciona e decide em função de objectivos claros.

 

V - E a atribuição de classificações?

Nas páginas anteriores, procurou-se mostrar que a avaliação pedagógica não é um fim em si mesma, devendo contribuir para a melhor aprendizagem dos alunos (que é, esse sim, o fim a prosseguir). A avaliação quer-se globalizante e integrante do processo de ensino/aprendizagem, não podendo definir-se fora do contexto que é a actividade pedagógica*. É também neste mesmo contexto que a problemática da atribuição de classificações será equacionada, isto é, ela deve espelhar, de um modo integrado, a variedade de aspectos que, relativamente a um determinado período de tempo, se foram observando, registando e analisando, tendo em conta pontos de partida, processos de aprendizagem e evolução do aluno.

Numa dinâmica de ensino/aprendizagem onde se privilegiou a prática da auto-avaliação e da metacognição enquanto práticas formativas e formadoras, o momento da atribuição de notas será, também ele, objecto de partilha e de transparência entre professor e aluno. Uma forma possível de dar corpo a esta dinâmica poderá ser o recurso ao portfolio ou dossier de avaliação. Para Arter & Spandel (in Weiss, J. (1996), p.26), o portfolio é "um conjunto de trabalhos significativos do aluno que dá uma visão dos seus esforços, dos seus progressos ou do seu desempenho, numa ou várias matérias. A escolha dos elementos constituintes deverá apelar à participação do aluno e incluir os critérios de selecção, as directivas que permitem julgar o valor das realizações e exemplos da auto-regulação do aluno". Para Simon & Forgette-Giroux (in Weiss, J. (1996), p.27), o portfolio é "uma recolha cumulativa e contínua de indicadores do percurso do aluno durante a sua aprendizagem, seleccionados e comentados pelo aluno e pelo professor, para fins de avaliação".

O portfolio permite, assim, um sumativo diferente, um sumativo do percurso, onde a "religião" da nota obtida em testes sumativos deixa de ser fonte privilegiada ou única de dados para a avaliação/classificação do aluno, passando a ser convocados outros elementos de informação. Que outros elementos de informação? O portfolio deve conter os principais trabalhos dos alunos, tais como relatórios, composições, investigações, testes, comentários de texto, fichas de leitura, trabalhos de grupo, trabalhos de casa, etc.. Quanto a outras evidências de aprendizagem, nomeadamente apresentações orais, respostas a questões orais, debates, discussões, a sua inclusão em portfolio far-se-á através de registos em grelhas próprias, como já foi defendido anteriormente.

Em síntese, conservar a informação relativa a todas as aprendizagens efectuadas pelos alunos é um recurso que o professor não deve negligenciar para poder posteriormente identificar o que ele conseguiu fazer, ter uma visão global do trabalho efectuado e verificar a sua evolução, não cingindo a avaliação a aspectos isolados ou pontuais daquilo que o aluno realizou. Esta opção pelo portfolio permite associar formativo/sumativo, porque é uma oportunidade de interacção professor/aluno sobre o trabalho realizado, porque os elementos aí constantes estão anotados e comentados pelo professor e até pelo aluno, possibilitando a ambos verificar se essas anotações foram úteis, se foram tidas em conta em trabalhos posteriores, se não se repetiram os erros e se se potenciaram os êxitos.

Quando o professor atribui uma nota final a cada aluno, essa nota é um resultado bruto pelo conjunto de todos os elementos de que dispôs para a avaliação; ora, esse resultado bruto deverá poder ser desmontado, explicado, dado que ele é o reflexo de um processo no qual intervieram vários factores. Para que no fim, o julgamento que se fez do aluno seja justificado, o professor teve que discutir com os alunos os critérios para avaliar de forma rigorosa os vários elementos e o grau de hierarquização entre eles.

Convirá, pois, que o professor proceda de forma interactiva com os alunos, com os encarregados de educação e que o momento da atribuição de notas deixe de ser assunto exclusivo do professor, tornando-se um momento de trocas, de discussão e de balanço de uma situação escolar, onde o factor "surpresa" não tem lugar. Para isso, o professor deverá:

- explicitar os critérios de avaliação e as "regras do jogo" aos alunos e aos encarregados de Educação;

VI - Conclusão

Os procedimentos de avaliação em Língua Materna são vários e a opção por um ou outro depende do objecto a avaliar, dos objectivos da avaliação e do contexto em presença. Quer se trate do oral ou do escrito, as variáveis são numerosas e diversas, o que torna difícil padronizar /normalizar referentes relativamente a cada domínio do ensino da língua. Há no mercado modelos "pronto a usar" de testes, fichas, grelhas, que o professor, tentado pela facilidade, usaria directamente, dispensando-se assim do esforço, pesado mas indispensável, de adaptação às necessidades e capacidades próprias dos seus alunos, aos objectivos que determinou para as sequências de aprendizagem e ainda ao ênfase que atribuiu a cada um deles. O professor terá presente estas variáveis, assim como os programas de ensino e o grau de progressão que estabeleceu, para construir, eventualmente a partir de um "modelo base", os referentes de avaliação de determinada actividade e o instrumento de avaliação mais adequado. Como afirma Tochon (1995) "a generalização de grelhas de avaliação é potencialmente perigosa: corre-se o risco de se metamorfosear o ideal de diferenciação e de autonomização da aprendizagem num processo de socialização escalonado, normalizado e depois controlado segundo processos repetitivos e aborrecidos" (Tochon, 1995, p. 159). Para além disso, o autor acrescenta ainda que um outro risco de generalização dos instrumentos de avaliação é que o professor "se torne escravo de especialistas em avaliação; privado do seu direito de acção e reflexão, ver-se-ia reduzido a um mero executante" (p. 160). E o aluno "em vez de ir marcando, numa folha, cada um dos seus actos de autonomia, encontra-se muito perto de ser encarado como um robô. Poder-se-ia à força de prognosticar as respostas esperadas, tirar ao aluno o direito de reflectir" (p.160).

É tendo em conta estas considerações que se recomenda a utilização pelos professores de língua materna dos outros opúsculos já editados pelo ME/DES nesta colecção, os quais contêm importantes sugestões de organização do ensino-aprendizagem da língua materna, mobilizáveis para a concepção de instrumentos de avaliação capazes de promover a aprendizagem e de servir como reguladores do processo e indicadores dos resultados.

VII - Bibliografia

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